11 mai
O povo brasileiro vê mais um escândalo de corrupção e já não sabe o
que sente, se indignação ou fastio. Muitos já não têm esperanças de que
esse triste e repetitivo espetáculo um dia termine.Desta vez, as informações divulgadas -a famosa pontinha do iceberg- nos dão uma visão estarrecedora: algumas das instituições mais importantes do país e até partes da sociedade estão permeadas por relações ilegais, dinheiro ilícito, tráfico de influência e até sequestro e extorsão.Nos comentários, aqui e ali despontam expressões como “máfia” e “Cosa Nostra”, representando um poder criminoso oculto incrustado em parte da própria estrutura do Estado e da sociedade.
É como se as estantes da sala ostentassem livros e objetos de fina arte intactos apenas em sua aparência, mas corroídos, desde as paredes, por traças e cupins. O Congresso, ministérios, governos estaduais, tribunais, polícia, empresas e até parte da imprensa dão sinais de infiltração e contaminação.
A democracia brasileira, que custou tanto esforço e sacrifício, é usada pelos operadores de tais esquemas como verniz para manter as aparências. E o mais preocupante é que o próprio processo de descoberta, investigação e punição do crime parece destinado a administrar o mal em vez de erradicá-lo.
A Comissão Parlamentar de Inquérito sobe ao palco para representar uma disputa política que, num ano eleitoral, estende-se pelas metrópoles e pelo interior levantando novas vestais e derrubando novos vilões, mas tudo rápido e passageiro, pois os grandes partidos -da situação e da oposição- estão envolvidos e, no próximo ano ou na próxima eleição, teremos outra montagem.
Velhos atores paramentam-se para novos papéis, trocam de lugar -acusadores passam a ser acusados- e acrescentam mais uma peça a seus currículos. Uma ópera-bufa, uma comédia de terror.
Não podemos perder as esperanças de que tudo isso resulte em avanços e aperfeiçoamento dos processos, de que as instituições corrijam e, sobretudo, previnam os sistemas de corrupção. Mas isso só será possível se pararmos de tratar a corrupção como se fosse um problema do governo que está de plantão, e passarmos a tratá-la como um problema a ser determinadamente enfrentado por todos os cidadãos e cidadãs de nossa nação.
Foi assim que reconquistamos nossa democracia e, em que pese os muitos aprendizes de feiticeiro, estabilizamos nossa economia, bem como diminuímos os índices inaceitáveis de pobreza, que por si só constituíam a maior denúncia do modelo concentrador e excludente de nossa economia.
É essa força da sociedade que nos livra de criarmos uma geração inteira sob o signo da conivência e da acomodação.
Folha de São Paulo
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