A entrevista ocorreu no começo do mês, dias depois do espetáculo na igreja. Tato chegou acompanhado de um pastor e de uma assistente social que trabalha em presídios. Empenhou-se para se portar como um homem de bem e educado. Falou baixo, gesticulou pouco, deu passagem para as damas para só depois avançar. Não se exaltou em momento algum, nem ao falar sobre temas espinhosos. Tato trouxe à tona um fato novo – e importante – para o caso. Afirmou, pela primeira vez em sete anos, que a arma usada no crime pelo pistoleiro Rayfran das Neves, também condenado e cumprindo pena, foi fornecida pelo então delegado da Polícia Civil de Anapu, Marcelo Luz. A informação, por si só, é suficiente para que o Ministério Público do Pará ou a Secretaria de Segurança Pública abram um novo inquérito para investigar o acusado. “Principalmente por se tratar de um funcionário público, isso precisa ser averiguado”, diz Edson Cardoso, promotor de acusação do caso. Segundo Tato, o delegado Luz lhe entregou o revólver calibre 38 para ele se proteger de possíveis invasões dos agricultores liderados por Dorothy. O alvo da disputa entre os fazendeiros que grilavam terras e os clientes da reforma agrária era o lote 55, uma área pública, cujo destino só cabe ao governo federal. O plano de Dorothy era assumir as propriedades controladas por grileiros e repassá-las, com a anuência da lei, aos sem-terra.
Não é a primeira vez que o nome de Luz é associado ao crime. Ele já havia sido acusado durante as investigações de pedir propina aos fazendeiros. Em troca, segundo essas acusações, prometia proteger os lotes da invasão dos agricultores. O próprio Tato descreve, em detalhes, uma reunião na estrada a caminho do aeroporto de Anapu em que o delegado Luz pedia R$ 10 mil por serviços de segurança privada. Ganhava corpo ali uma espécie de milícia armada, semelhante às estabelecidas em favelas do Rio de Janeiro. Pelo trabalho sujo, à época o delegado foi afastado das investigações do assassinato de Dorothy
Stang, além de ter respondido a um processo administrativo. Voltou à ativa, e hoje está como chefe da delegacia de Viseu, no nordeste do Pará.
A Polícia Federal (PF), responsável pela sindicância, não conseguira rastrear o verdadeiro trajeto da arma usada no assassinato – mesmo depois de uma pesquisa exaustiva. “Sabemos que o revólver é da empresa Taurus e que foi entregue para Rayfran pelo Tato”, afirma Ualame Machado, delegado da PF. “Mas como ele foi parar nas mãos do Tato nunca ficou esclarecido.” A pistola foi fabricada antes de 1997, quando ainda não era obrigatório no Brasil registrar uma arma de fogo ao comprá-la. Procurado por ÉPOCA, o delegado Marcelo Luz não se pronunciou.
As razões de Tato para tentar reavivar as investigações podem ir além da pura culpa cristã. Os mandantes podem: 1) ter lhe pagado pela encenação, na tentativa de conseguir a liberdade; 2) ter ameaçado sua família. Ao final da entrevista, como para reforçar a fleuma de bom moço, Tato ofereceu à reportagem de ÉPOCA uma rosa vermelha vendida no semáforo. “É pelo dia das mulheres.”
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