O Juiz titular da 2.ª Vara Federal do Trabalho de Marabá, Jonatas dos Santos Andrade, recebeu na última segunda-feira (17) das mãos da Presidente Dilma Roussef em Brasília, o Prêmio Direitos Humanos 2012. O juiz recebeu comenda e o título em solenidade ocorrida no Palácio do Itamaraty em Brasília.
O certificado é dado anualmente pela Secretaria dos Direitos Humanos da Presidência da República a quem contribui para a ampliação da sensibilidade da Sociedade Brasileira sobre a necessidade do respeito aos Direitos Humanos.
O juiz paraense conquistou a premiação na Categoria “Erradicação do Trabalho Escravo”, e é sobre as atividades de sua premiação, é que o juiz conversa com a reportagem do Zeca News.
Sobre o atual estágio do sul e sudeste do Pará em relação ao trabalho escravo
Eu considero que é uma evolução na questão. Nessa nossa região encontramos os maiores números de resgates de trabalhadores escravizados. Hoje, não é que a incidência tenha diminuído, mas a quantidade de trabalhadores resgatados diminuiu.
Dificilmente encontramos centenas de milhares de trabalhadores como já houve. Hoje o que ocorre são resgates em número menor. Mas ainda com bastante freqüência, ou seja, a coisa ficou pulverizada. E creio que o Estado, enquanto conjunto orgânico, enfrentou mais adequadamente a questão que no varejo, o trabalho dos grupos móveis continuam atuando e no “atacado” houve alguns Termos de Ajuste de Conduta, foram levados para o Ministério Público Federal onde a cadeia produtiva foi responsabilizada por essa pratica. Detectada a pratica de trabalho escravo na cadeia produtiva, aqueles que recebem a mercadoria, como as grandes redes atacadistas, frigoríficos, essas indústrias podem ser responsabilizadas por isso.
Eu considero que o enfrentamento da questão tem evoluído. A par disso, os projetos que a gente vem tocando aqui no sul e sudeste do Pará com um envolvimento institucional maior e com a sociedade civil organizada também. Temos dois projetos substanciais aqui na região, que é o de “Monitoramento de trabalhadores ameaçados” e o “Escravo nem Pensar” que será realizado com certeza em toda região sul e sudeste do Pará.
O projeto de monitoramente já existe desde julho do ano passado (2011), logo após a morte de sindicalistas, ambientalistas que houve aqui na região. Logo após essas mortes o projeto foi implantado. Desde a sua implementação nós já temos um diagnóstico de 33 lideranças. Essas 33 lideranças tiveram até hoje suas vidas preservadas, espero que continuemos assim. Não houve nenhuma ameaça concretizada para essas vidas. Isso traz a coisa para níveis mais civilizados, mas não significa nenhum alinhamento ideológico.
É lógico que certas lideranças se praticarem ilícitos por elas responderão. Mas responderão segundo as regras civilizadas que nós elegemos, jamais na barra.
Sobre manter os condenados na prisão.
A condenação de trabalho escravo, a condenação criminal ela ainda está acontecendo, pois nós tivemos um grande período de impasse em termos de competência. Sobre quem julgava, a Justiça Estadual ou Federal. Hoje, após a solução desse impasse pelo Supremo, nós tivemos diversas condenações, dezenas, talvez centenas de condenações.
Mas isso ainda está em nível recursal. Nós vamos verificar como é que se comporta a jurisprudência dentro desse crime que digamos, não chama muito a atenção porque não ocorre em um ambiente urbano. Mas é de uma gravidade substancial especialmente para a cadeia da produção. Não se concebe mais hoje que nós tenhamos por consumo produtos que sejam objetos de desmatamento, de grilagem ou de trabalho escravo. Temos que limpar essas cadeia dessas chagas.
O consumidor reage ao saber que determinado produto que ele está utilizando é fruto de trabalho escravo ou desmatamento como a carne por exemplo. Então não tem atividade econômica que se sustente com isso. E com isso tem uma repercussão geral na produção e no trabalho propriamente dito.
Sobre a a legislação brasileira, precisa mudar?
Na minha opinião a legislação penal brasileira é suficiente e avançada. O que nós precisamos realmente evoluir é apenas na questão constitucional, que é uma proposta de emenda constitucional que falta ser votada no senado. Ela já foi votada em dois turnos, no senado e na câmara que é a PEC-438 que desapropria terras. Assim com as terras de plantações psicotrópicas que são desapropriadas. Também acontecerá o mesmo em áreas onde se flagar o trabalho escravo.
A PEC-438 precisa ser votada pois houve uma alteração na camara, uma alteração que serve pra incluir o trabalho escravo em nível urbano.
Quais as alternativas encontradas para minimizar o problema?
Especificamente a aplicação dos dois projetos que já foram mencionados. Ainda hoje estamos lutando por um instrumento, um disque-denúncia trabalhista para a região. Mas já temos esses dois projetos em plena execução. Que são tocados pelo Gaet que é esse grupo de articulação que envolve jurisdição, justiça do trabalho, promoção do Ministério Público e a fiscalização também. Isso articulado com setores da sociedade civil para além do processo propriamente dito, que é o que nós temos a nossa atividade cotidiana, a gente possa ter uma atuação preventiva.
Os dois projetos o “Monitoramento de trabalhadores ameaçados” e o “Escravo nem Pensar” são dois projetos, duas iniciativas significativas para melhora desse quadro aqui na região.
Houve algum caso recente de julgamento de trabalho escravo?
Nós temos diversas ações civis públicas ajuizadas pelo Ministério Público na região sul e sudeste do Pará. Em geral essas coisas se resolvem apenas aplicando o TAC e não precisam chegar a esfera judicial. Hoje basta se ameaçar de levar a questão pra justiça que há uma resolução entre o ministério público e a parte. Isso em geral se reverte em obras e serviços para a comunidade além do resgate do pagamento das indenizações dos trabalhadores.
Recebe algum tipo de pressão?
As pressões existem, mas até o presente momento dentro das regras do jogo e da legalidade, aquilo que derivou disso não se revelou substancialmente. Onde houve alguma pressão ou ameaça não-legítima por via oblíqua ou de forma dissimulada isso não se revelou verdadeiro. Não houve necessidade de nenhuma medida adicional de segurança individual ou coletiva. Mas toda a estrutura do judiciário tem se voltado para uma aplicação mais efetiva da jurisdição nessa região. O que é motivo de regozijo e orgulho para todo o judiciário da oitava região.
Como se sente sendo premiado?
É o reconhecimento pelo trabalho realizado nessa questão do enfrentamento do trabalho escravo e que nos deixa muito satisfeitos e muito orgulhosos. Mais cientes de que isso só aumenta a nossa responsabilidade e também é fruto de todo um esforço coletivo especialmente da jurisdição, da promoção e da fiscalização do trabalho nessa região. Não podemos deixar de externar nossa satisfação com essa premiação.
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