Extrativistas, José Claudio e Maria eram incansáveis nas denúncias de desmatamento e grilagem no assentamento Praia Alta Piranheira, onde moravam. A atuação política contundente custou-lhes suas vidas. Hoje Laísa, irmã de Maria, está em Nova York para participar da cerimônia de encerramento do Ano Internacional das Florestas, na sede da Organização das Nações Unidas. Ela receberá um prêmio especial, um reconhecimento da luta de José Claudio e Maria para preservar a floresta.
Maíra Kubík Mano
O olhar de Laísa é impactante. Carrega uma tristeza que não parece estar perto de terminar. Com uma voz calma, ela comenta as últimas ameaças que recebeu. “Uma menina perguntou para a minha filha que tipo de transporte eu iria usar para viajar. E a minha filha respondeu que de moto. E ela disse: ‘eu vou fazer um pedido e tu fala para a tua mãe. Pede para ela não ir de moto, pelo menos dessa vez. Quem avisa amigo é’”.
Laísa Santos Sampaio é irmã de Maria do Espírito Santo, que em 24 de maio de 2011 foi morta ao lado de seu marido, José Claudio Ribeiro da Silva, no município de Nova Ipixuna (PA). Eles sofreram uma emboscada de dois pistoleiros justamente quando iam de moto para a cidade.
Extrativistas, José Claudio e Maria eram incansáveis nas denúncias de desmatamento e grilagem no assentamento Praia Alta Piranheira, onde moravam. A atuação política contundente custou-lhes suas vidas.
Hoje Laísa está em Nova York para participar da cerimônia de encerramento do Ano Internacional das Florestas, na sede da Organização das Nações Unidas. “Menina, está um frio aqui”, diz, simpática.
Laísa receberá um prêmio especial, um reconhecimento da luta de José Claudio e Maria para preservar a floresta. “É uma grande responsabilidade falar em nome de pessoas tão importantes, que defenderam uma causa tão importante. Eu estou no compromisso de representar esses heróis. Não só Maria e Zé Claudio, mas muitos outros. Lembrar o que eles fizeram é também um compromisso comigo mesma, é cumprir com a minha parte. Na hora que eu recebi o telefone da ONU, eu fiquei emocionada por eles. Pensei: ‘imagina se eles estivessem vivos!’ É um reconhecimento que eles não tiveram a oportunidade. São pessoas que não foram valorizadas pelos governos”, comenta.
A viagem aos Estados Unidos surgiu a partir do filme “Toxic Amazon”, dirigido pelo brasileiro Felipe Milanez e o mexicano Bernardo Loyola, que tem como fio condutor a história da morte do casal. A ONU convidou Milanez para exibir trechos do documentário na cerimônia e ofereceu o prêmio especial. O jornalista indicou então Laísa para receber a homenagem. Em poucos dias, ela teve que tirar seu primeiro passaporte e – o mais difícil – um visto americano.
Outro brasileiro, o ambientalista Paulo Adário, do Greenpeace, receberá o prêmio de “herói da floresta” por sua atuação na América Latina. Cada região do mundo terá um contemplado: na África, será Paul Nzegha Mzeka, de Camarões; na Ásia, Shigeatsu Hatakeyama, do Japão; na Europa, Anatoly Lebedev, da Rússia; e dos Estados Unidos, Rhiannon Tomtishen and Madison Vorva, pela América do Norte.
Mulheres
Na ONU, Laísa quer contar a história do assentamento e como é possível viver do extrativismo. “Nós aprendemos a usar a floresta com ela continuando em pé. A floresta não é intocável, mas é economicamente viável”, defende.
Ela participa de um grupo de mulheres que se reúne aos finais de semana para produzir óleo de andiroba, utilizado em cosméticos e hidratantes.
Sua irmã Maria foi a mentora do projeto. “Em 2006 ela buscou formação para nós. Ela reuniu todo mundo e descobrimos como fazer o manejo e o potencial da andiroba”. Laísa pretende profissionalizar mais a produção e obter autorização da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para comercializá-la.
“O problema é que nós não temos políticas públicas para fortalecer a produção. Não existe crédito para quem vive da floresta. Temos 80% de floresta em nosso lote e não conseguimos crédito para trabalhar. Existe crédito para criar gado, mas não para a floresta”, critica.
Ameaças
O projeto ficou um pouco parado com a morte da irmã. Logo depois do crime, ela se mudou temporariamente para a casa de parentes em Marabá. Desde o início de 2012, porém, Laísa retornou ao assentamento e às suas atividades. Voltou a dar aulas na escola local onde é professora.
“Nós pedimos um posto policial lá dentro para inibir as ações ilegais. Tendo um posto lá, o caminhão não ia sair carregado de castanhais. E intimidava aqueles que estão prontos para matar. Depois dos assassinatos, o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) fechou madeireiras, mas em Nova Ipixuna a maioria das madeireiras já está funcionando. Faz 8 meses que eles morreram e nada foi feito”, denuncia Laísa.
“A retirada da madeira está tímida, não está intensa como era antes. Acho que eles estão dando um tempo. Agora as carvoeiras, quase todas que funcionavam estão funcionando. O carvoeiro vem levando tudo, fica aquele deserto”, lamenta. Segundo levantamento feito pela família do casal, existem cerca de 100 fornos de carvão em funcionamento no assentamento.
“Até janeiro eu falava que estava ameaçada. Agora eu sinto na pele. Cada vez que eu saio na imprensa, conquisto mais a antipatia daqueles que estão me vendo como dedo-duro”.
Ela relata alguns casos: “Um menino estranho perguntou para o meu filho se a porteira da nossa casa ficava aberta ou fechada à noite. Outro dia, antes de ir para Nova York, uma criança de uns 14 anos entrou na escola, parou e ficou me olhando em pé, na porta, perto do quadro. Quando eu disse ‘oi’ para ele, ele saiu correndo e subiu numa moto onde estava um senhor”.
Ainda no mesmo tom de voz, Laísa fala sobre seu encontro com Gilberto Carvalho, ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência da República, antes de embarcar para Nova York. “Ele falou de fazer o possível para que tenhamos um encontro com a Dilma”. O que ela falaria para a presidenta? “Eu diria, de imediato: ‘eu quero viver’”.
Laísa Santos Sampaio é irmã de Maria do Espírito Santo, que em 24 de maio de 2011 foi morta ao lado de seu marido, José Claudio Ribeiro da Silva, no município de Nova Ipixuna (PA). Eles sofreram uma emboscada de dois pistoleiros justamente quando iam de moto para a cidade.
Extrativistas, José Claudio e Maria eram incansáveis nas denúncias de desmatamento e grilagem no assentamento Praia Alta Piranheira, onde moravam. A atuação política contundente custou-lhes suas vidas.
Hoje Laísa está em Nova York para participar da cerimônia de encerramento do Ano Internacional das Florestas, na sede da Organização das Nações Unidas. “Menina, está um frio aqui”, diz, simpática.
Laísa receberá um prêmio especial, um reconhecimento da luta de José Claudio e Maria para preservar a floresta. “É uma grande responsabilidade falar em nome de pessoas tão importantes, que defenderam uma causa tão importante. Eu estou no compromisso de representar esses heróis. Não só Maria e Zé Claudio, mas muitos outros. Lembrar o que eles fizeram é também um compromisso comigo mesma, é cumprir com a minha parte. Na hora que eu recebi o telefone da ONU, eu fiquei emocionada por eles. Pensei: ‘imagina se eles estivessem vivos!’ É um reconhecimento que eles não tiveram a oportunidade. São pessoas que não foram valorizadas pelos governos”, comenta.
A viagem aos Estados Unidos surgiu a partir do filme “Toxic Amazon”, dirigido pelo brasileiro Felipe Milanez e o mexicano Bernardo Loyola, que tem como fio condutor a história da morte do casal. A ONU convidou Milanez para exibir trechos do documentário na cerimônia e ofereceu o prêmio especial. O jornalista indicou então Laísa para receber a homenagem. Em poucos dias, ela teve que tirar seu primeiro passaporte e – o mais difícil – um visto americano.
Outro brasileiro, o ambientalista Paulo Adário, do Greenpeace, receberá o prêmio de “herói da floresta” por sua atuação na América Latina. Cada região do mundo terá um contemplado: na África, será Paul Nzegha Mzeka, de Camarões; na Ásia, Shigeatsu Hatakeyama, do Japão; na Europa, Anatoly Lebedev, da Rússia; e dos Estados Unidos, Rhiannon Tomtishen and Madison Vorva, pela América do Norte.
Mulheres
Na ONU, Laísa quer contar a história do assentamento e como é possível viver do extrativismo. “Nós aprendemos a usar a floresta com ela continuando em pé. A floresta não é intocável, mas é economicamente viável”, defende.
Ela participa de um grupo de mulheres que se reúne aos finais de semana para produzir óleo de andiroba, utilizado em cosméticos e hidratantes.
Sua irmã Maria foi a mentora do projeto. “Em 2006 ela buscou formação para nós. Ela reuniu todo mundo e descobrimos como fazer o manejo e o potencial da andiroba”. Laísa pretende profissionalizar mais a produção e obter autorização da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para comercializá-la.
“O problema é que nós não temos políticas públicas para fortalecer a produção. Não existe crédito para quem vive da floresta. Temos 80% de floresta em nosso lote e não conseguimos crédito para trabalhar. Existe crédito para criar gado, mas não para a floresta”, critica.
Ameaças
O projeto ficou um pouco parado com a morte da irmã. Logo depois do crime, ela se mudou temporariamente para a casa de parentes em Marabá. Desde o início de 2012, porém, Laísa retornou ao assentamento e às suas atividades. Voltou a dar aulas na escola local onde é professora.
“Nós pedimos um posto policial lá dentro para inibir as ações ilegais. Tendo um posto lá, o caminhão não ia sair carregado de castanhais. E intimidava aqueles que estão prontos para matar. Depois dos assassinatos, o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) fechou madeireiras, mas em Nova Ipixuna a maioria das madeireiras já está funcionando. Faz 8 meses que eles morreram e nada foi feito”, denuncia Laísa.
“A retirada da madeira está tímida, não está intensa como era antes. Acho que eles estão dando um tempo. Agora as carvoeiras, quase todas que funcionavam estão funcionando. O carvoeiro vem levando tudo, fica aquele deserto”, lamenta. Segundo levantamento feito pela família do casal, existem cerca de 100 fornos de carvão em funcionamento no assentamento.
“Até janeiro eu falava que estava ameaçada. Agora eu sinto na pele. Cada vez que eu saio na imprensa, conquisto mais a antipatia daqueles que estão me vendo como dedo-duro”.
Ela relata alguns casos: “Um menino estranho perguntou para o meu filho se a porteira da nossa casa ficava aberta ou fechada à noite. Outro dia, antes de ir para Nova York, uma criança de uns 14 anos entrou na escola, parou e ficou me olhando em pé, na porta, perto do quadro. Quando eu disse ‘oi’ para ele, ele saiu correndo e subiu numa moto onde estava um senhor”.
Ainda no mesmo tom de voz, Laísa fala sobre seu encontro com Gilberto Carvalho, ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência da República, antes de embarcar para Nova York. “Ele falou de fazer o possível para que tenhamos um encontro com a Dilma”. O que ela falaria para a presidenta? “Eu diria, de imediato: ‘eu quero viver’”.
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