Mostrando um retrato fiel do estilo talentoso e explosivo, a biografia Furacão Elis ganha reedição no ano que marca três décadas sem a cantora. Turnê-homenagem com a filha Maria Rita está prevista para março
19.01.2012| 01:00
Entre muitos amores e desafetos, Elis construiu uma carreira tão sólida que chegou a desafiar sua própria morte, ocorrida em 19 de janeiro de 1982. Dona de um faro apurado para sucessos e de um estilo passional de interpretação, ela continua sendo uma influência para as novas gerações. Que o diga sua única filha, a cantora Maria Rita, que este ano entra em turnê gratuita por cinco cidades brasileiras homenageando a mãe. Com previsão de estreia em março, os shows fazem parte do projeto Redescobrindo Elis, capitaneado por João Marcello Bôscoli – irmão de Maria Rita por parte de mãe –, que inclui ainda exposição, documentário e reedições.
Entre os relançamentos está a biografia Furacão Elis, lançada pela jornalista Regina Echeverria três anos após a morte da artista. Revelando detalhes da intimidade da estrela, como seu prazer pela vida doméstica e a mania por sapatos, o livro é ainda hoje um único relato de peso sobre a vida da cantora. Muito disso se deve ao fato da autora ter conhecido uma Elis além do profissional. Elas foram apresentadas durante os ensaios da turnê Falso Brilhante, quando Echeverria era repórter do Jornal da Tarde (SP), e acabaram ficando amigas. “Ela tinha fama de ser difícil. O que não era verdade. O fato é que nos gostamos de cara”, conta ela por email.
Apesar da defesa da escritora, a tal fama de difícil de Elis já era conhecida e já havia lhe rendido o apelido de Pimentinha, dado por Vinicius de Moraes. Nem a família escapou. De uma garotinha tímida nascida em Porto Alegre, ela tornou-se uma estrela ainda cedo e não tinha medo de demonstrar seu poder. Logo no início da carreira, já morando no Rio Janeiro, chegou a brigar com todos de casa e ainda proibiu a mãe de usar seu telefone para falar com o pai, que havia voltado para Porto Alegre. Outra vez, já casada com Ronaldo Bôscoli, criou uma confusão à mesa por que ele havia lhe pedido o sal. Após um festival de palavrões, presenciado pela equipe da revista Cláudia e pelo amigo Miele, Ronaldo olha pra ela e diz: “Você viu aquele filme que está no cinema?”. “Qual é? Vamos lá. Toma o sal”, respondeu ela.
No trato com os colegas de profissão, seu estilo não era menos enérgico. Ao ver Caetano Veloso tomar conta dos festivais com seu Tropicalismo, chegou a encabeçar uma “Passeata Contra as Guitarras”, para defender a “tradição” da música brasileira. Nem mesmo os bastidores dos seus grandes clássicos foram tranquilos. Quando foi a Los Angeles gravar ao lado do maestro Tom Jobim, ela ligava para Roberto Menescal para dar suas impressões. “Está uma merda, não tem nada de bom, o Tom é um babaca, um chato”, disparava. Ele perguntava de volta: “Mas, Elis, esse tempo todo não saiu nada?”. Ela então começava a descrever faixa a faixa e rever sua avaliação: “Estou louca pra chegar ao Brasil e te mostrar. Todas as faixas estão lindas”.
E era esse mesmo jeito passional que Elis colocava nas suas interpretações, sempre cheias de sentimento e emoção. “Elis era uma cantora do Brasil com uma voz do outro mundo. Talentosa, afinada, com dicção perfeita e excelente na escolha do repertório”, elogia Regina Echeverria. Autora também das biografias de Cazuza (Só as mães são felizes) e Gonzaguinha (Gonzaguinha e Gonzagão, uma história brasileira), ela vê uma semelhança entre seus personagens: “O amor à música. A dedicação ao ofício de compor e cantar”. Sobre a mistura fatal de álcool e cocaína que levou à morte da estrela, Regina não esconde: “Para mim foi um acidente de percurso”. E quando o assunto é o legado deixado pela cantora nesses 30 anos de ausência, ela resume: “Sua voz límpida, segura, vibrante, emocionada. A sua personalidade, a coragem de dizer o que pensava e fazer o que bem entendia”.
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